“O meu testemunho: rutura e reparação”
É a autora da exposição que a apresenta no seu conteúdo e na sua forma
"Eu sou uma artista que trabalha, sobretudo, com fotografia e uma psicóloga e psicanalista que trabalha, sobretudo, as questões do trauma. Ambos os trabalhos são motivados pela minha inquietação com as injustiças sociais e ambientais e o meu desejo de provocar mudança. Envolvo os modelos (voluntários, que não são meus pacientes) num processo profundo, no sentido de encontrarem um caminho que convoque a sua gestualidade como testemunhas, ao mesmo tempo que imaginam o público que irá testemunhá-los. Nesta série de fotografias, manualmente modificadas, as “práticas” do consultório fundiram-se com a “arte” de fotografar, criando imagens que obrigam e insistem que o olhar do público, outrora imaginado, coincida com o olhar dos modelos. Estes são tempos sombrios e cortantes. No futuro, a reparação acontecerá, mas já estaremos marcados e feridos pelos ataques à nossa democracia, ao planeta e à saúde mental. Confrontamos, e continuaremos a confrontar, a falta de humanidade e a injustiça para com aqueles que são remetidos à invisibilidade e privados da sua subjetividade devido a raça, sexualidade, identidade de género, idade, etnia e/ou deficiência. Reconhecemos e prestamos atenção ao nosso passado violento para não o repetirmos no futuro. Estas feridas simbolizam as nossas perdas que devem ser reconhecidas, para que façamos o luto e o transformemos, no sentido de ocorrer mudança. As fotografias impressas com tinta pigmentada em papel de arquivo são rasgadas para criar feridas que representem o sofrimento individual e coletivo e para mais tarde virem a ser curadas. O papel dourado por trás da fotografia aparece pelos rasgões costurados aleatoriamente com linha dourada. A minha inspiração surgiu da arte japonesa kintsugi, uma técnica milenar que cola cerâmica partida com uma mistura de laca com pó de ouro, em que os cacos, quando colados de volta, são realçados pelas fissuras douradas, sem qualquer disfarce. Metaforicamente, kintsugi honra a aceitação da lesão como parte da vida do objeto integrando as experiências na sua nova forma. Através da pose, dos gestos, dos olhares e dos adereços ocasionais, quem se oferece como modelo dos meus retratos encontra as suas narrativas, restaura a capacidade de agir, e convida outros a olhá-lo em toda a sua humanidade. Embora a bandeira americana se tenha tornado num símbolo complicado, alguns modelos recuperaram- na e reinventaram-na para expressarem o seu desafio e esperança respeitosa pelo regresso da democracia. Como conjunto fotográfico, o fundo de veludo preto constante nas fotografias e a iluminação chiaroscuro unem cada indivíduo ao colectivo.
Donna Bassin
Esta exposição conta com a colaboração da Incubator Gallery e PsiRelacional Associação de Psicanálise Relacional
Exposição patente de 27 de abril a 8 de junho de 2024, no MIRA FORUM de quarta a sábado das 15h00 às 19h00
Nota Biográfica
Donna Bassin é uma arte-terapeuta, psicóloga clínica, psicanalista, cineasta, e fotógrafa. É professora-adjunta e assistente clínica no programa de pós-doutoramento da Universidade de Nova Iorque em Psicoterapia e Psicanálise, onde leciona “Luto como transformação: a borda criativa do luto traumático e normal.” Publicou livros, recensões críticas, artigos sobre género, maternidade, ativismo comunitário, luto, e memórias, as suas fotografias foram exibidas em museus e galerias e os seus dois documentários premiados foram exibidos em conferências, Leave no Soldier e The Mourning After. Estes documentários contam as histórias de veteranos americanos enquanto exploram e partilham o impacto do stress pós-traumático nas suas vidas e o uso da arte e da comunidade nos seus “regressos a casa”.
