21:30 até às 23:59
Codex Aviziboa a Bruxa de Torres Vedras

Codex Aviziboa a Bruxa de Torres Vedras

Grátis
CODEX AVIZIBOA, A BRUXA DE TORRES VEDRAS
28 de NOVEMBRO 2018
(última quarta-feira do mês)
#16ªsessão 

- SESSÕES CODEX são tertúlias culturais e artísticas dedicadas à vida e ao legado de figuras marcantes da História de Portugal. Em cada sessão, em ambiente tertuliano, os convidados CODEX irão manifestar novos olhares em formato aberto sobre a figura escolhida, permitindo a cada pessoa uma interpretação livre da personagem.

Entrada Livre! 
Local: LER DEVAGAR - LX FACTORY
Rua Rodrigues Faria, n.º 103 - G 0.3
1300-501 Lisboa
Hora: 21h30 

Participantes: 
MÁRIO SOARES / JORGE MARTINS /SUSANA MATEUS / ANTÓNIO CARLOS CARVALHO  
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Em 10 de maio de 1492, ano da descoberta do Novo Mundo e da expulsão dos judeus da Espanha, a Chancelaria Real Portuguesa  dirigiu-se ao rei D. João II, para que este emitisse a sua opinião sobre um episódio de feitiços acontecido na vila de Torres Vedras, envolvendo uma judia. Esse pedido, enviado ao monarca, documentado no Livro de Chancellaria V, fol. 34v, teria partido de uma moradora da região chamada Lianor Pires, que denunciou a “hua judia [Aviziboa] que hordenara feitiços ao dito seu marido [Pero Nunes]”. Da leitura do documento surge, então, a pergunta: Quais seriam os feitiços atribuídos a essa mulher judia? Revistos os textos, vemos que os feitiços efectuados na vila de Torres Vedras divergem das cerimónias mencionadas acima na lista cronológica (pode ler o texto na integra no link que se encontra no final do descritivo deste evento).
 Há nesse culto mágico duas etapas distintas: 

1. Aviziboa prepara “hum bollo para lhe dar a comer e elle lhe querer bem e outras cousas, na[m] declarando que cousas eram...”.
 
2. Aviziboa “tomava chumbo derretjdo com terra e lançava-o em aguoa, e fazia hua fegura [figura] de homem e outra de molher de barro, e que lhes dava com hum cordell e dizia sobresto [sobre isto] suas horações e pallavras, e que per esta via o dito seu maridol he querrya grande bem e não seria sallvo o que ella sopricamte quisesse...”.

 O costume de fazer um bolo para os maridos aparece com muita frequência em Portugal. Tudo indica que era um culto essencial para o sucesso dos feitiços. Mas, nem sempre os preparativos ajudavam a enfeitiçar. Assim, em 10 de abril de 1490, “huma Maria Álvares fizera hum bollo, e que fizera feitiços e o dera a comer a hum homem seu amigo... etc” (Liv. XII, fol. 115). 
Desse bolo não teriam surgido seus feitiços, como o bolo da judia Aviziboa tampouco teria ajudado a enfeitiçar Pedro Nunes. Então, o que fazer quando o bolo não ajuda na hora dos feitiços? Num momento como esse, para obter êxito, a feiticeira deve passar a um outro culto. Ela prepara uma escultura ou um desenho de boneca que represente a figura à qual estariam direccionados os feitiços. Os elementos que possibilitam feitiços são de vários tipos e cada um deles tem uma função específica, a saber: feitiços através do ar são denominados aerimância; por meio de água hydromância e por acção do fogo pyromância. Feitiços através da terra ou barro são conhecidos como feitiços de geomância. O caso de magia acontecido em Torres Vedras com Aviziboa enquadra-se, portanto, nessa última categoria. 

Quem era essa enigmática figura de nome Aviziboa? Quais eram os seus atributos e qualidades? A primeira leitura não permite obter maiores informações da judia Aviziboa. Não há referências à sua idade, inserção social nem aos seus hábitos ou estilo de vida. Não obstante, há três possibilidades para identificá-la:
 
1. É plausível que seja uma figura de carne e osso, que tenha realmente existido e habitado na antiga vila de Torres Vedras, porém, com o seu nome não foi possível identificar nos arquivos da cidade, perdidos no tempo; 

2. O documento descreve os factos acontecidos com uma mulher que habita na periferia de Torres Vedras e visitou o lugar por um período relativamente curto. Também aqui não há certeza alguma; 

3. É possível que Aviziboa seja um personagem imaginário, uma figura fictícia, uma mulher que legitime imputar sérias culpas à população judaica local.

Uma vez que a documentação está incompleta, as duas primeiras possibilidades não fazem nenhum sentido, restando apenas acreditar que a terceira possibilidade, mesmo especulativa, possa elucidar. Por que seria, pois, Aviziboa um personagem imaginário? Primeiramente, o nome Aviziboa desperta perplexidade. Numa revista sistemática de nomes, sobrenomes e toponímicos portugueses do século 15, não consta o nome. Parece difícil também acreditar que possa ser um nome de uso comum entre judeus. Sobre o significado filológico do nome há lugar para várias interpretações. Encontramos a forma Avi-ziboa que na tradução ao árabe seria “Ibn Ziboa”, da mesma forma que Avi-cena aceitaria o árabe “Ibn Sina”, ou Avizohr seria a tradução para o árabe da forma “Ibn Zohr”. Seja como for, todas essas variações são apenas hipóteses do significado e da grafia da forma Aviziboa. Em segundo lugar, em relação aos nomes do casal Pires e Nunes, não há motivo para especulações. Ambos são nomes ou sobrenomes bastante difundidos que aparecem com freqüência também entre os judeus, antes e depois da conversão forçada de 1497, decretada pelo édito do rei D. Manuel I de Portugal. O nome Pires aparece em vilas de judeus como Torre de Moncorvo, Trancoso, Barcelos, Fundão, Covilã e Lamego. Vale lembrar que Diogo Pires, um personagem cujos poderes mágicos o fizeram centro das atracções na História de Portugal e na História Judaica, era Salomão Molcho (Shelomó Molko), um dos mais importantes falsos messias, discípulo de David Reuveni, o judeu responsável por uma forte onda messiânica entre cristãos novos portugueses do século 16. 
O sobrenome Nunes aparece difundido especialmente entre judeus e conversos. Basta mencionar o nome de Heitor Nunes, judeu que migrou para Inglaterra na segunda metade do século 16, ou o célebre geógrafo e matemático Pedro Nunes, autor do Tratado da Esfera. Este último leccionou na Universidade de Coimbra e em 1529 foi agraciado com o título de “Cosmógrafo da Corte”. Mas, após as perseguições terem atingido também numerosos cientistas, Pedro Nunes e seus familiares foram presos e processados pelo Santo Ofício da Inquisição. Terceiro, os feitiços de Aviziboa não permitem determinar se eles eram aplicados num espaço aberto ou fechado. Na Idade Média, era frequente observar actos de magia ao ar livre, em meio a natureza. Vejamos alguns exemplos: 

1. Em 13/11/1453, Gil Lourenço costumava fazer feitiços e magia nos caminhos e cruzamentos de caminhos; 

2. Em 21/07/1462, Elvira de Ribeiro fazia feitiços causando danos graves à terra, atingindo [com seus actos] moinhos de farinha e máquinas para triturar cereais. A leitura do documento referente aos feitiços de Aviziboa, no entanto, permite concluir que seus actos teriam sido realizados em lugares fechados longe do grande público.

Retirado daqui: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/maaravi/article/view/1635/1722
Recomendamos que confirme toda a informação junto do promotor oficial deste evento. Por favor contacte-nos se detectar que existe alguma informação incorrecta.
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