21:30 até às 23:30
Paulo da Costa Domingos e Pedro Calapez

Paulo da Costa Domingos e Pedro Calapez

Exposição com trabalhos inéditos de Pedro Calapez feitos a propósito do lançamento do livro "A céu aberto" de Paulo da Costa Domingos (edição Averno). Com a presença dos dois autores. 

Exhibition with new works by Pedro Calapez made on occasion of the launch of Paulo da Costa Domingos' book "A céu aberto" (Averno editions). With the presence of the two authors.

Intimamente unidos
“e vós, ó caríssimos, que estais longe, vós mortos e vós vivos, como estivemos intimamente unidos!”
“Hipérion ou o Eremita da Grécia”, de Friedrich Hölderlin

A céu aberto são tantos os esgotos e as lixeiras. A céu aberto abrem-se todas as possibilidades de atravessar a paisagem e descobrir, pela mão de Diotima, de Antínoo, de Laura, de Orfeu ou de Inês, os rigores e êxtases da poesia. A céu aberto estamos expostos aos efeitos do tempo, esse lugar próprio da impermanência. Das suas origens mais remotas aos últimos dias, é sempre a céu aberto que a vida dos homens se joga, nessa espera do momento crucial no qual se torna necessário o dizer. E é através das palavras que se dá a ler a “interrupta consciência do real”. É na reabilitação do real quotidiano, naquilo que de facto existe, que é necessário investir. Há ainda uma verdade por contar: “E é preciso gente para a debandada/ é preciso o raio a cabeça o trovão/ a rua a memória a panóplia das árvores (…)” (“Manuel de Prestidigitação” (1981), de Mário Cesariny).
Entre os que melhor têm cumprido, nos territórios da poesia portuguesa actual, essa tarefa de reinventar o real quotidiano encontra-se Paulo da Costa Domingos. “A Céu Aberto” constitui o mais recente capítulo desse exercício no qual se propõe um programa muito concreto: revelar o estado de uma sociedade em implosão, recorrendo, para isso, a textos que visam uma espécie de acção directa, sendo essencial nessa tarefa a particular atenção dada à música das palavras: os versos deste livro, tal como das obras deste autor que vieram anteriormente a lume, ganham em ser lidos em voz alta: “Vastas paradas de gente/ fluem na ilusão mediática/ que os prédios reflectem/ na interrupta consciência/ do real. A pintura acusa/ fissuras, nos seus rostos/ os testemunhos vibram/ a cada esticão, degrau/ a degrau. Cada paisagem/ querida afasta-se numa linha/ manuscrita por escrever.” (p. 33)
A poesia de Paulo da Costa Domingos é política, nela confluindo não só as tradições do surrealismo, da internacional situacionista, do abjeccionismo, da “beat” e da poesia do quotidiano, mas também heranças de outros séculos: Camões, Baudelaire, as cantigas de amigo, os trovadores provençais, etc. Não há por aqui nem dó, nem piedade: “Falsos mensageiros, num jornal, / vendem a boa nova documentada/ pela fotografia que anuncia/ a abertura do mercado de escravos,/ e que o Mundo afinal é um círculo/ fechado do tamanho de um punho/ cerrado contra a maçã-de-adão,/ sem ideal nem estímulo,/ apenas espelhos para compor/ a maquilhagem e ensaiar sorrisos/ à entrada e à saída da galeria.” (p.34). E é assim, com a verdade por companhia, que somos levados as percorrer as páginas de um livro que se inicia com uma descrição da desolação, a quem o poeta dedica o seu labor: 
“Às flores secas à beira/ da estrada na fronteira/ dedico uma secreta/ 
ignorada solidão, o não/ esquecimento sofrido/ numa oferenda em/ 
silêncio e treva.” (p. 5).

Em 2017, esta é ainda uma poesia possível. Ela cumpre a função de um testemunho. Como escreve Cesariny num poema, “Pastelaria”:  “Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos/ frente ao precipício/ e cair verticalmente no vício.” Sem medo, de olhos fechados, assim foram escritos os textos de um livro que une intimamente uma tradição de editores e autores: Vítor Silva Tavares (&etc), Paulo da Costa Domingos (Frenesi), Manuel de Freitas, na casa de quem, a Averno, é publicada a obra que é dada agora a lume. E que tudo arda na leitura de cada um destes textos pontuados pelos negros e agudos desenhos digitais de Pedro Calapez (Lisboa, 1953), revelados também agora numa exposição preparada especialmente pelo artista para o Sismógrafo. Intitulados “Carregado de Nuvens”, estes trabalhos intensificam o clima dos textos, deixando apenas uma curta margem para que a respiração não necessite de ajuda artificial.

Poesia e arte: assim se vai cumprindo o nosso desejo de olhar criticamente para o mundo e devolver as chamas que ainda brilham na noite escura: “Não será esta portanto/ a mais bela idade da vida,/ mas não deixa o Outono/ de ter seu peculiar encanto:/ sua dádiva de calma doçura/ e mansidão que para vós coa/ um magnífico vinho novo.” (p.8)

O.F.
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