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Do Erótico na Doçaria Portuguesa

Paulo Moreiras


Ilustração de Fitacola

 

«Enquanto se capa não se assobia», diziam os antigos e com razão, uma vez que enquanto se faz algo não se deve fazer ou pensar em outra coisa. Infelizmente não segui tal preceito. Quis a minha desdita que no decurso de algumas pesquisas gastronómicas encontrasse um vasto conjunto de termos ou expressões usados na nossa doçaria tradicional, e de certa forma na dita “doçaria conventual”, utilizados para nomear determinadas iguarias, onde se notava um forte pendor erótico, por vezes explícito, por vezes dissimulado e que por ali andava o sexo escondido, sob o manto diáfano da fantasia culinária.

Dei por mim a cogitar sobre estes recursos eufemísticos e disfemísticos, sendo que o eufemismo e o disfemismo são figuras de estilo recorrentes na nossa literatura bem como na nossa oralidade e vivência quotidiana. A primeira pretende disfarçar ideias desagradáveis através do uso de termos e expressões mais suaves, ligeiras. A segunda, pelo contrário, é depreciativa, pois pretende expressar uma realidade desagradável de uma forma ainda mais agressiva, por vezes, com o intuito de acentuar o vigor de uma frase ou de uma expressão. As palavras têm e provocam este fascínio. Já disso falam os escritores e os poetas. Nem sempre querem dizer o que realmente dizem, tal como referem os velhos adágios: nem tudo o que reluz é ouro ou nem todo o mato são orégãos.

este é terreno fértil e imaginoso, propenso a eróticas ilações.

Naquele que é considerado o primeiro tratado de cozinha portuguesa, Arte de Cozinha, de Domingos Rodrigues, editado em 1680, podem encontrar-se, por exemplo, duas referências: Pastelinhos de Boca de Dama e Torta de Línguas. Mais tarde apareceriam as Línguas de Dama. Não é preciso muita imaginação para perceber que aqui se fala de beijos. Desenvolviam-se as artes da galanteria e o seu apogeu acontecia com a conquista de um beijo.

Mas outros exemplos abundam na nossa doçaria. Não longe desta temática andam os Papos de Anjo ou as Barrigas de Freira, que pela sua clausura dão azo à lasciva imaginação dos potenciais comedores e gulosos. Foram também encontradas referências a Freirinhas, Beijos de Freira e Garganta de Freira, o que nos deixa antever o grau de eroticidade com que então baptizavam as suas criações culinárias. É curioso verificar que grande parte destas doces iguarias foram inventadas em meios fechados, conventos e mosteiros e que, devido à sua natureza, quase diabólica, foram transfiguradas com outros nomes mais delicados e poéticos. Assim se entende que este é terreno fértil e imaginoso, propenso a eróticas ilações.



Ilustração de Fitacola

 

E que dizer também das Pombinhas de Alcorce do Convento da Conceição, em Elvas, sendo que o vocábulo Alcouce, é outro nome para designar um lupanar ou bordel, ou os Charutos de Amêndoa, ou as Fofas do Faial, nos Açores, ou ainda os Derriços, doce típico de Penacova, que, de acordo com os dicionários, se refere a impertinências ou chacotas, mas que também querem dizer, popularmente, as pessoas que se namoram. Outro que despertou curiosidade foi um doce conhecido por Pitos de Santa Luzia, provável como referência disfemística ao sexo da mulher, uma vez que em meios rurais a vagina é popularmente apelidada de pito.

Em relação aos homens, encontram-se também algumas referências eufemísticas, como é o caso, por exemplo, das Orelhas-de-Abade, dos Fofinhos do Convento, das Bolas do Paraíso, do Doce Serafim ou das Fatias do Conde, de Penacova, a que nos escusamos de acrescentar explicações mais detalhadas. Uma referência especial, pelo seu carácter explícito, para o Pirilau do Frade Ambrósio, com origem no antigo Convento do Loreto, em Vila Nova da Barquinha.

Esta é uma tendência inata na nossa lusitana forma de ser

E estes são apenas alguns poucos exemplos de um vasto rol de doces que existem em Portugal, com uma forte carga erótica associada. Esta é uma tendência inata na nossa lusitana forma de ser, em que gostamos de dizer as coisas sem muitas vezes as nomearmos em concreto. A língua portuguesa, como é costume dizer-se, é muito traiçoeira e permite muitas leituras.

Por tudo isto, caros leitores, queiram ter cuidado aquando da próxima vez desejarem provar um doce da nossa gastronomia. Pensem na história que ele esconde, por que o desejo e a tentação foram e serão sempre os motores da nossa lusa imaginação, pois a cozinha nunca esteve muito longe da cama.



Ilustração de Fitacola
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